Como não deixar de dar parabéns pra cidade que mais amo no mundo. Por que foi onde nasci? acho que é pouco. Onde aprendi a falar o brasileiro, peguei sotaque paulistano , aquele do Adoniran Barbosa? já tá melhorando bastante. Por onde fugi de casa tantas vezes, primeiro pra perto, uma praça, depois me soltando das mãos da minha mãe, me perdendo ao agarrar as pernas de outras mães que não eram as dela e voltar. Até, finalmente, não mais me importar com o fato de estar perdida. Então sonhei mais longe. Não bastava fugir e voltar, queria pegar um navio, ganhar o mundo. Mas demorou bastante, porque não sabia em que direção ficava o porto de partida: norte? sul? leste? oeste?
Então passei a sonhar que São Paulo tinha praia. Que paulistana/o não sonha a cidade com praia? Até hoje o sonho da praia vem e sempre é uma festa: uma hora a praia é uma acesso de areia clarinha que encontro ao lado da casa onde nasci, e fico admirada com a descoberta de achar uma via tão rápida, uma casa tão pé na areia. Outra vezes, tenho que caminhar pra mais longe, meu sonho vai para um lugar em São Paulo que a gente pode de fato ver o mar.
Por muito tempo achei que este lugar não existia de verdade. Era coisa de sonhadora de cidades que sou. Mas o tal lugar existe. Assim como eu vi com meus próprios olhos um homem vendendo caranguejo no Bixiga , outro indo de sunga na padaria e um monte de lanchas e barcos a vela em ponto de partida na avenida dos Bandeirantes.
Na semana passada, minha querida amiga Tina veio em casa toda misteriosa e me disse: tenho algo pra te dar que você vai adorar!
Não tá fácil ser uma pessoa que gosta de perambular pelas ruas e ver que cada dia que passa o nosso sonho de abertura morre na praia. Então perguntei pra ela: se for cachorro pra me fazer companhia aqui em casa eu não quero. Ela, uma “cachorrenta incorrígivel”, respondeu: não é cachorro, é melhor que cachorro. Eu duvidei: melhor que cachorro? e ai finalmente ela abriu a sacola e me deu um livro. Este ai da foto do post , “Entre a cidade e a floresta: a vida e os desafios de comunidades tradicionais do extremo sul da cidade de São Paulo”.
O livro é um estudo do Instituto Refloresta de 2013 em que busca nos aldeamentos indígenas e nos terreiros de candomblé que ocupam o extremo sul da cidade mostrar como estes grupos presentes no território de fronteira, imersos ainda na floresta como parte integrante de seus rituais, deslocamentos e maneiras sustentáveis de cultivarem o solo, convivem e ensinam como podemos caminhar para o mar e viver na floresta, como parte do quintal da nossa casa. Eles vivem nesta fronteira, na Serra do Mar, bem no meio da Mata Atlântica. E não é só sonho meu afirmar que quando se caminha para o extremo sul da cidade de São Paulo a gente pode ver o mar, sonhar barquinhos, comer caranguejo e andar de sunga.
O livro que ganhei , de verdade, foi muito melhor do que cachorro. Fez lembrar dos meus sonhos. Os sonhos me levaram para outros tempos, quando descobri um lugar em São Paulo que podemos ter vista do mar. E o melhor, mesmo sabendo da realidade do meu sonho, continuo imaginando caminhos e descobertas que não me deixem morrer na praia. Acho que isso já é suficiente para finalizar esta declaração de amor por São Paulo. Litoral da minha existência. Meu eterno caminho do mar.
Para saber mais:
Entre a cidade e a floresta: a vida e os desafios tradicionais do extremo sul da cidade de São Paulo. Instituto Refloresta, 2013.
imagens: as fotografias deste post são todas do livro citado e blog Cicloturismo
Sou seu fã e gosto muito do que e como escreve… muitas realizações e sucesso a você Paula Jano. .
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Querido amigo, obrigada por sua leitura e elogios, faz bem pra esse coraçãozinho sonhador! Abraço
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